Durante a 5ª Edição das Conferências Índico, sob o tema “Mercado Segurador e a Indústria Extractiva: Perspectivas para o Benefício do Conteúdo Local em Moçambique”, Denise Cortês-Keyser, consultora e assessora para África no Global Gas Centre, em Genebra, apresentou uma visão incisiva e estratégica sobre as dinâmicas da indústria extractiva em Moçambique. A sua análise abarcou o papel crucial da tecnologia, da inclusão social e da gestão sustentável dos recursos naturais para o desenvolvimento económico.
O Desafio da Inclusão Local na Cadeia de Valor
Denise Cortês-Keyser destacou que, para que as indústrias extractivas beneficiem verdadeiramente o desenvolvimento económico de países como Moçambique, é essencial que as multinacionais se ajustem às realidades locais. “Se não criarmos condições para integrar as comunidades e empresas locais nas cadeias de valor, estamos a perpetuar um modelo de crescimento excludente”, afirmou.
De acordo com o Banco Africano de Desenvolvimento (2021), a maioria dos países africanos ricos em recursos naturais enfrenta desafios semelhantes: enquanto as indústrias extractivas impulsionam o PIB, o impacto económico e social é frequentemente desigual, com as comunidades locais a ficarem à margem, mesmo nos locais onde esses recursos estão sendo explorados.
Um relatório da Open Society Foundations também destacou que a falta de transparência e de inclusão das comunidades nas tomadas de decisão tem contribuído para o aumento das desigualdades em países ricos em recursos naturais, como Moçambique.
Para Denise Cortês-Keyser, a solução passa por criar um sector privado robusto e competitivo, capaz de se inserir de forma significativa nas cadeias de fornecimento das grandes corporações internacionais. Ela reiterou a necessidade de fortalecer as empresas locais para que estas possam competir em pé de igualdade com fornecedores internacionais.
“A nossa estratégia não pode ser apenas extrair recursos e vendê-los. Temos de transformar esses recursos localmente, criando uma cadeia de valor que envolva todos os níveis da sociedade”, frisou. A crítica de Denise Cortês-Keyser aponta para a falta de integração de fornecedores locais, um problema que se reflecte na dificuldade em escalar pequenas e médias empresas (PMEs) e na exclusão de grande parte da população dos benefícios económicos.
Capacitação Técnica: A Chave para o Valor Acrescentado
Um dos temas centrais abordados foi a necessidade de capacitação técnica das empresas locais para que possam aproveitar plenamente o potencial dos recursos naturais. Moçambique, rico em reservas de gás natural, tem a oportunidade de se tornar um dos maiores exportadores mundiais de gás liquefeito, mas para isso precisa de garantir que o valor acrescentado permaneça dentro de suas fronteiras. “Sem capacitação técnica e inovação, continuaremos apenas a extrair recursos para outros beneficiarem-se”, alertou.
Estudos da Oxford Policy Management (2020) indicam que, sem um aumento substancial nos investimentos em capacitação técnica e inovação, Moçambique corre o risco de ser apenas um exportador de matérias-primas, sem aproveitar os ganhos de uma cadeia de valor mais complexa. O relatório aponta para a importância de desenvolver indústrias de transformação ligadas ao sector energético, como refinarias de gás ou indústrias petroquímicas, que poderiam multiplicar os empregos e gerar mais riqueza local.
“A transformação local não é apenas uma questão de crescimento económico, mas de soberania e auto-determinação. Precisamos de controlar o destino dos nossos recursos”, afirmou, sublinhando a importância de uma estratégia nacional integrada que priorize a formação técnica e a criação de empregos de alta qualificação no setor energético.
Um Ambiente de Negócios Inclusivo: Políticas para PMEs e Comunidades Locais
Denise Cortês-Keyser destacou ainda o papel fundamental de políticas públicas que fomentem um ambiente de negócios inclusivo. “As Zonas Económicas Especiais (ZEEs) são uma oportunidade crucial para que as PMEs locais possam competir e crescer. No entanto, sem um apoio estruturado, muitas destas empresas são incapazes de acessar as oportunidades que as ZEEs oferecem”, alertou.
Para Denise, o acesso ao capital, a criação de produtos e serviços financeiros ajustados às empresas locais e comunitárias, bem como as elevadas taxas de juros são alguns dos principais obstáculos enfrentados pelas PMEs moçambicanas. Um relatório da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA, 2022) mostra que apenas 15% das PMEs moçambicanas estão actualmente integradas nas cadeias de valor da indústria extractiva. Este dado reflecte o potencial não explorado dessas empresas, cuja inclusão é vital para o desenvolvimento sustentável.
A Fundação Mo Ibrahim (2021) também reconhece que o desenvolvimento das PMEs é um dos pilares mais importantes para a industrialização e crescimento económico sustentável de África, mas que muitas vezes é negligenciado nos setores de maior capital intensivo, como o sector extractivo.
Ademais, Denise apontou que há necessidade de partilha atempada dos planos de procurement das multinacionais para que as empresas locais se prepararem e formem parcerias estratégicas. “As multinacionais devem comunicar de forma mais transparente e atempada os seus planos de procurement, permitindo que as empresas locais tenham tempo para se preparar e competir com igualdade”, defendeu.
Democratização e Inclusão Social: Um Caminho para a Equidade
Outro ponto crucial da intervenção de Denise foi a necessidade de democratizar os processos decisórios na indústria extractiva, envolvendo de forma mais efetiva as comunidades locais. “Quantas vezes vemos as comunidades locais serem excluídas das grandes decisões económicas que afectam as suas vidas? A inclusão deve ser transversal a todos os níveis da cadeia de valor, e não limitada a tarefas periféricas”, referiu.
A equidade de género foi outro tema fortemente enfatizado. Denise citou o exemplo de Folorunsho Alakija, a empresária mais rica de África, como um símbolo do que pode ser alcançado quando as barreiras estruturais de acesso à cadeia de valor da indústria extrativa para as mulheres são eliminadas. No entanto, ela alertou que, em muitos países africanos, as mulheres continuam sub-representadas em posições de liderança, às formações técnico-profissionais, acesso ao capital, particularmente em setores dominados por homens, como o da energia e dos recursos naturais.
No que concerne à questão de liderança, de acordo com o Relatório Global de Desigualdade de Género do Fórum Económico Mundial (2022), as mulheres representam menos de 10% das posições de liderança na indústria extrativa em África, reflectindo a necessidade urgente de políticas que promovam a inclusão de género.
Um Futuro Sustentável: Tecnologia, Parcerias e Respeito às Comunidades
Na sua visão para o futuro, Denise Cortês-Keyser defendeu que o sucesso do setor extrativo em Moçambique dependerá de uma combinação de fatores: o uso adequado da tecnologia, o fortalecimento de parcerias entre governo, sector privado local e investidores, e, acima de tudo, o respeito pelos direitos das comunidades locais. “O desenvolvimento sustentável só será possível se respeitarmos as pessoas que vivem nas áreas onde os recursos são extraídos e garantirmos que os benefícios do crescimento cheguem a todos”, concluiu.
Ela reiterou que a chave para o sucesso da indústria extrativa em Moçambique reside na colaboração eficaz entre as partes interessadas, com foco na inclusão e capacitação das PMEs, na equidade de género e na criação de políticas públicas que estimulem um ambiente de negócios inclusivo. “Se continuarmos a ignorar as vozes das comunidades locais, estamos a comprometer o futuro de toda a indústria”, afirmou com convicção.
Conclusão
Denise Cortês-Keyser apresentou uma visão clara e estratégica para o futuro da indústria extractiva em Moçambique: um futuro onde as comunidades locais, as PMEs, as mulheres e os líderes são capacitados para participar em todos os níveis da cadeia de valor. O sucesso, segundo ela, passa por uma transformação profunda nas políticas públicas, a mudança de mentalidade por parte dos Gestores séniores dessas grandes empresas, no investimento em inovação e na criação de um ambiente de negócios verdadeiramente inclusivo. “O desenvolvimento sustentável em Moçambique será construído sobre as fundações da inclusão e da capacitação, ou não será”, concluiu.
Sobre Denise Cortês-Keyser
Denise Cortês-Keyser é uma distinta Empresária Moçambicana, Consultora de Finanças e Investimentos, bem como Oradora Internacional Pública e Motivacional, com quase 25 anos de experiência inestimável. Com uma formação como Contabilista Certificada e uma licenciatura em Gestão, juntamente com uma pós-graduação em Finanças Empresariais e certificação em Gestão Sustentável da Cadeia de Abastecimento pelo Instituto de Liderança Sustentável da Universidade de Cambridge (CISL), Denise está bem equipada para impulsionar o sucesso em qualquer negócio ou organização.
O seu impressionante historial inclui o cargo de Vice-Presidente para Estudos, Projectos e Conselho de Marketing da Federação Moçambicana de Futebol, demonstrando a sua aptidão em funções de liderança estratégica. Além disso, Denise ocupa uma posição fundamental como membro do Conselho Consultivo da Operation Water, uma organização americana sem fins lucrativos dedicada a fornecer acesso à água às comunidades rurais em África.
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