Profile Mozambique: Qual é hoje o papel da PwC Moçambique dentro da rede global da PwC e que enfoque a firma tem dado aos projectos de transformação empresarial no país?
Carlos Jerónimo: A PwC é uma network global de firmas, organizada em clusters regionais. No nosso caso, integramos a estrutura que agrega PwC Portugal, Moçambique, Angola e Cabo Verde. Em cada geografia contamos com escritórios e equipas dedicadas a apoiar os clientes localmente. Em Moçambique, apesar da presença de longa data, durante muitos anos a operação esteve ligada à PwC África do Sul. Há cerca de dois anos, este quadro mudou e hoje estamos integrados neste cluster de países sob coordenação da PwC Portugal, reforçando a nossa capacidade de actuação no mercado nacional.
Na área que lidero, de transformação de negócio, apoiamos clientes de diversos sectores, energia, financeiro, industrial, serviços públicos, entre outros, em projectos estruturantes de transformação, que vão desde a redefinição de processos até à transformação digital. Com mais de 25 anos de experiência nesta área, posso afirmar que a tecnologia é uma peça central, mas não a única, neste processo.
O nosso modelo de intervenção cobre todo o percurso da transformação empresarial, planeamento estratégico, gestão de programas de transformação e implementação tecnológica. Fazemo-lo através de uma equipa multidisciplinar que integra especialistas em consultoria de gestão, finanças, recursos humanos, experiência do cliente, gestão de programas e tecnologia.
Alguns clientes optam por contar connosco em todas as fases, outros recorrem à PwC apenas em etapas específicas do processo.
É nesta lógica que actuamos, apoiar os clientes a tornarem-se mais ágeis, eficientes, competitivos e, no limite, contribuir para o crescimento da economia nacional.
PM: A PwC tem vindo a expandir a sua oferta formativa em Moçambique com foco em Digital & Analytics, IA, cibersegurança e transformação digital.
– Que papel desempenha essa crescente oferta formativa na democratização do acesso a dados de qualidade? A PwC vê os dados como uma commodity acessível apenas às grandes organizações ou como um recurso possível de ser agregado de forma ética e inclusiva, incluindo PME e sector público?
CJ: Quando falamos em transformação de negócios, há um factor central que se destaca, os dados. O crescimento exponencial do volume de dados, fenómeno global que também se verifica em Moçambique, coloca hoje às empresas o grande desafio de os transformar em informação útil e, mais do que isso, em valor económico. Todos os dias, em diversos sectores, da energia à indústria, das finanças ao consumo, são gerados milhões de dados. A questão é como extrair deles informação relevante para a tomada de decisão e como transformar essa informação em activos de negócio.
O conceito de dados como ‘commodity’ é relativamente recente, mas cada vez mais decisivo. Tal como outros recursos naturais, os dados estão a ser reconhecidos como activos económicos transacionáveis, com potencial para gerar novas fontes de receita e impulsionar a economia. Estudos internacionais estimam que a monetização de dados atinja taxas de crescimento anuais acima de 25% até 2034.

Neste contexto, há três dimensões fundamentais, em primeiro lugar, as empresas precisam definir modelos de negócio que lhes permitam rentabilizar os dados de forma estruturada. Em segundo, é essencial investir na literacia de dados, dotando colaboradores da capacidade de interpretar e utilizar informação de forma estratégica. Em terceiro, é necessário investir em tecnologia que permita não apenas armazenar, mas também analisar, visualizar e aplicar dados em tempo real.
Na PwC temos seguido essa lógica, começando internamente, com forte investimento na formação das nossas equipas em ferramentas de business intelligence, análise avançada e inteligência artificial. Hoje, grande parte do nosso trabalho, tanto dentro da organização como em projectos para clientes, assenta na utilização de dados e de tecnologia de ponta.
Em Moçambique, já estamos a levar esta experiência diretamente aos clientes, integrando a capacitação em projectos de transformação digital. Um exemplo é o sector público, onde apoiamos a implementação de novos sistemas de ERP ligados à energia. Mais do que substituir tecnologia, trabalhamos em paralelo na formação de quadros, garantindo que os colaboradores não apenas utilizam as novas ferramentas, mas também conseguem extrair delas informação relevante para decisões mais rápidas e eficazes.
PM: A PwC Moçambique presta apoio estratégico às funções financeiras e fiscais, ajudando a transformar dados em activos que permitem uma contabilidade e fiscalidade mais transparente e em tempo real.
– Num ambiente onde os dados contábeis são cada vez mais exigidos em tempo real e com maior transparência, como vê a PwC o papel dos dados como commodity estratégica para a integridade institucional? E que desafios tecnológicos ou regulatórios persistem nesse campo?
CJ: Na PwC Moçambique, entendemos que o desenvolvimento positivo que se verifica em Moçambique na adopção de legislação e normas contabilísticas e fiscais cada vez mais exigentes tem vindo a alinhar-se com padrões internacionais, comparáveis aos de países economicamente mais avançados. Observamos uma acção visível por parte do Governo e das autoridades competentes para garantir que o mercado cresça de forma sustentada, com regras claras, verificáveis e dentro de um âmbito de concorrência justa e regulada.
Reconhecemos que este contexto representa desafios significativos para as empresas, que precisam adaptar rapidamente os seus processos internos para cumprir eficazmente essas obrigações legais e fiscais. Na PwC, apoiamos as empresas neste percurso através de várias especialidades que harmonizamos dentro dos projectos que construímos.
Na vertente fiscal, contamos com uma tradição consolidada e liderança de mercado, garantindo que as obrigações legais e fiscais das empresas sejam cumpridas, contemplando aspetos financeiros e de recursos humanos. Paralelamente, a nossa área de auditoria assegura a revisão rigorosa destes processos. Ademais, na consultoria, ajudamos as empresas a criar estruturas e processos internos que facilitem a conformidade com estas regras fundamentais.
Destacamos ainda a importância da tecnologia na optimização destes processos. O que as empresas procuram cada vez mais é agilizar a gestão de informação e dados de forma íntegra, rastreável e centralizada. Assim, garantimos que os dados possam ser auditados e reconhecidos de forma confiável.
Por fim, enfatizamos a transformação dos dados de negócio em informação estratégica para a tomada de decisão. Para além de responder às obrigações legais, ajudamos as empresas a utilizar esta informação para definir estratégias de crescimento, decidir sobre financiamento, avaliar novos mercados e estruturar campanhas de marketing. Plataformas tecnológicas, como sistemas ERP, e modelos avançados de análise preditiva e inteligência artificial são essenciais para que os gestores possam projectar cenários e tomar decisões mais assertivas.
PM: Vai integrar o painel que abordará o tema “Monetização de dados e modelos de negócio”, na 7ª edição das Conferências Índico. Que contributos espera trazer para as empresas moçambicanas, para o sector público e, de forma abrangente, para toda a comunidade que irá acompanhar esta sessão?
Para nós, trata-se de um debate de enorme actualidade, sobretudo no contexto moçambicano, onde a gestão estratégica de dados pode ser um verdadeiro catalisador de eficiência e crescimento económico.
Acreditamos que a transformação digital deve assentar em três dimensões centrais. Em primeiro lugar, na capacidade de transformar dados em valor útil. Já não enfrentamos a escassez de informação, mas sim o excesso dela, por isso, torna-se essencial estruturar e organizar os dados de forma a gerar conhecimento com impacto real. Em segundo lugar, entendemos que a utilização dos dados deve tornar as organizações mais ágeis, competitivas e orientadas para resultados.
É fundamental irmos além do mero cumprimento de requisitos de reporte ou auditoria, usando os dados para reduzir custos, melhorar a experiência do cliente e criar novos modelos de negócio. Em terceiro lugar, defendemos que os dados são também uma alavanca para a inovação, permitindo desenvolver produtos, serviços e modelos de monetização já validados noutros mercados e que podem ser adaptados à nossa realidade.
Reconhecemos, contudo, que esta transformação exige três condições fundamentais, maior consciencialização executiva, definição de modelos de negócio sustentáveis baseados em dados e actualização dos quadros regulatórios, para assegurar confiança, rastreabilidade e transparência.
Acrescentamos ainda que tecnologias como computação em nuvem, inteligência artificial, blockchain e internet das coisas deixaram de ser opcionais e tornaram-se inevitáveis. Cabe, portanto, a cada organização definir o seu próprio roteiro de maturidade digital.