Nos últimos dias, Moçambique assistiu a uma intensificação de protestos que atingiram níveis preocupantes para a economia nacional, afectando directamente os megaprojectos que desempenham um papel significativo no Produto Interno Bruto (PIB).
As multinacionais são responsáveis por mais de 70% das exportações de Moçambique. Empresas como a fundição de alumínio MOZAL, a petroquímica Sasol e a Kenmare, que explora areias pesadas, são exemplos proeminentes.
Recentemente, na localidade de Topuito, distrito de Larde, província de Nampula, manifestantes invadiram o estaleiro da mineradora irlandesa Kenmare, que opera em Moma. Os protestantes impediram a aterragem da avioneta que transportava trabalhadores e executivos da empresa no aeródromo local. Relatos indicam que as principais vias de acesso à mina e ao acampamento da empresa foram bloqueadas por apoiantes do candidato presidencial Venâncio Mondlane. Exigiram que o administrador e o director-geral da Kenmare assinassem um acordo comprometendo-se a acelerar a construção da ponte sobre o rio Larde, infraestrutura considerada crucial para a população local.
A Kenmare é uma das multinacionais que regista lucros significativos em Moçambique, dados indicam que, em 2023, a empresa faturou 27,5 mil milhões de meticais com as suas operações.
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No início desta semana, manifestantes invadiram e ocuparam o centro de processamento de gás natural da Sasol em Temane, distrito de Inhassoro, província de Inhambane.
Interrupção do fornecimento de Gás para a África do Sul
Os manifestantes, provenientes das comunidades locais, expressaram descontentamento com a alegada falta de oportunidades de emprego e benefícios sociais proporcionados pela Sasol, empresa sul-africana que opera na região há vários anos. As reivindicações incluem maior inclusão nos postos de trabalho gerados pelo projecto e investimentos em infra-estruturas comunitárias.
Durante a ocupação, os manifestantes forçaram os funcionários a desligar o gasoduto que abastece a África do Sul, interrompendo temporariamente o fornecimento de gás natural ao país vizinho. Esta acção visa pressionar a Sasol e as autoridades moçambicanas a atenderem às demandas da comunidade local.
Bloqueio à principal via de exportação afecta operações da MOZAL
No município da Matola, um grupo de residentes bloqueou totalmente a estrada de acesso ao Parque Industrial de Beluluane, onde está situada a MOZAL, produtora de alumínio responsável por uma parte significativa das exportações moçambicanas. Os manifestantes ergueram barricadas e queimaram pneus na via que se conecta à Estrada Nacional Número 4 (EN4), principal rota utilizada pela MOZAL para transportar alumínio da fábrica ao Porto de Maputo e para os mercados de exportação. Consequentemente, os trabalhadores foram forçados a utilizar vias alternativas, enfrentando longas caminhadas.
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A MOZAL é um empreendimento conjunto de fundição de alumínio no Parque Industrial de Beluluane e integra os “megaprojetos” em Moçambique. A empresa dedica-se exclusivamente à produção de alumínio para exportação, tendo já sido responsável por mais de 50% das exportações totais do país.
Economista alerta para consequências graves da interrupção das exportações estratégicas
Para ilustrar o risco que esta nova vaga de protestos representa para o país, o economista Egas Daniel esclareceu que, embora os megaprojetos contribuam pouco para o desenvolvimento das comunidades locais, a sua paralisação pode desacelerar o crescimento do PIB, o que seria catastrófico para a economia.
Daniel alertou que as exportações estão concentradas nos megaprojetos, que são fundamentais para a obtenção de divisas necessárias para cobrir as importações. “No dia em que a MOZAL, Vulcan, Eni, Kenmare, Sasol e outras empresas não exportarem devido a um contexto político adverso, certamente teremos pressões no nosso câmbio, que neste momento é artificial”, afirmou.
Um relatório recente do Centro de Integridade Pública (CIP) estima que dez dias de manifestações podem resultar em perdas de 24,5 mil milhões de meticais, equivalentes a 2% do PIB previsto para 2024.
Contribuição dos megaprojectos para a economia
Apesar do seu peso nas exportações, a contribuição dos megaprojectos para as receitas do Estado e para o PIB tem sido considerada insignificante. Estudos indicam que, em determinados períodos, os megaprojetos contribuíram com apenas 0,004% para as receitas globais do Estado, equivalente a 83 milhões de meticais, e 0,01% para o PIB, cerca de 207 milhões de meticais.
Esta discrepância entre os lucros gerados e a contribuição fiscal tem sido alvo de críticas, com especialistas a defenderem a necessidade de políticas que assegurem uma distribuição mais equitativa dos benefícios provenientes dos recursos naturais.
Perspectivas
A continuidade dos protestos e a instabilidade política podem comprometer a operação dos megaprojectos, afectando negativamente a economia moçambicana. É imperativo que o governo e as empresas envolvidas adotem medidas que promovam o desenvolvimento das comunidades locais e assegurem uma distribuição justa dos benefícios económicos, de modo a mitigar tensões sociais e garantir a sustentabilidade económica do país.