Monday, October 13, 2025
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Tiago Martins: “Transtrevo expande operações para três continentes e reforça presença em Moçambique e Angola”

Profile Mozambique: Poderia começar por contar-nos, brevemente, a história da Transtrevo, quando e onde foi fundada, qual foi a motivação inicial, e como evoluiu até se tornar um operador logístico com presença em vários países?

Tiago Martins: Nós somos a Transtrevo – Global Logistics Solutions, fundada em Angola em 2016. Desde o início, quisemos criar um transitário africano de raiz, com identidade africana e com capacidade internacional. A nossa motivação inicial foi suprimir a lacuna num mercado onde muitos operadores logísticos locais estão sob gestão externa, reportando-se à Europa, à África do Sul ou a outros países. Queríamos inverter isso, construir algo que nascesse, operasse e se desenvolvesse aqui, mas sem fronteiras.

O nosso modelo evoluiu para sermos uma empresa de nicho com forte presença em Angola e Moçambique, os nossos mercados centrais. A partir destes países, expandimos para outros escritórios em África do Sul, Portugal e Espanha. Neste momento temos ainda em vista escritórios no Brasil e no Dubai, consolidando o nosso alcance global.

Operamos com serviços integrados, transporte marítimo, aéreo, rodoviário transfronteiriço, gestão de cargas de trânsito, despacho aduaneiro, logística contratualizada, cargas de projecto, e gestão de armazéns.

Tiago Martins, CEO – TRANSTREVO GLOBAL LOGISTICS.

Hoje, avaliamos que a nossa história comprova que é possível nascer africano e operar global, crescemos de uma operação local para uma rede com cinco países, com forte presença em Angola, Moçambique, África do Sul, Portugal e Espanha, e projectos de expansão. Continuaremos a investir para consolidar a nossa presença, melhorar a eficiência e servir os nossos clientes com soluções logísticas robustas, confiáveis e inovadoras.

PM: Como se define hoje a identidade da Transtrevo (missão, visão, valores) no contexto dos mercados africanos lusófonos? (Já vi no site que a missão realça eficiência, serviço ao cliente, inovação, bem como o compromisso com desenvolvimento económico e sustentabilidade.)

TM: Definimos a nossa identidade nos mercados africanos lusófonos a partir de uma missão clara, de uma visão estratégica e de valores sólidos que guiam todas as nossas operações. O nosso lema, “Keep it simple, make it global”, traduz o compromisso de simplificar processos logísticos complexos e de oferecer soluções à escala internacional, com foco em eficiência, inovação e excelência no serviço ao cliente. Mais do que vender serviços, assumimos como propósito resolver os problemas concretos dos nossos clientes, sejam empresas ou empreendedores, em Moçambique, em Angola ou noutros mercados onde actuamos.

A nossa visão é a de colocar Moçambique e Angola no mapa como centros de decisão em operações logísticas internacionais, orgulhosamente africanos e com ambição global. Trabalhamos para que, a partir destes países, se possam oferecer serviços equivalentes aos das multinacionais de referência, mas com a diferença de que as decisões e a gestão partem daqui, de nós próprios.

PM: Em relação a presença geográfica e estrutura organizacional: Quantos países e escritórios a Transtrevo possui actualmente, e onde se situam os centros operacionais mais importantes?

TM: Nós temos vindo a consolidar uma presença geográfica estratégica, sempre com foco nos corredores logísticos que ligam Moçambique e Angola ao resto do mundo. A nossa história começou em Luanda, onde abrimos o primeiro escritório, seguido de Maputo, que se tornou rapidamente num dos nossos centros operacionais mais relevantes. Em Angola, expandimos ainda para o norte, com escritórios no Caminho e no Lobito, reforçando a ligação às cadeias de valor locais.

A partir daí, fomos crescendo de forma gradual e sustentável. Estabelecemos presença em Joanesburgo, Lisboa e Madrid, alargando a nossa rede para garantir soluções de ponta tanto para África como para a Europa. Mais recentemente, avançamos para Santos, no Brasil, e estamos em fase de abertura de um escritório no Dubai, um passo estratégico que nos permitirá consolidar a cobertura global em mercados-chave do Médio Oriente.

No plano doméstico, seguimos um modelo de expansão que chamamos de plug and play, no qual priorizamos identificar primeiro as pessoas certas dentro da nossa própria equipa antes de abrir novas delegações. É um modelo que valoriza o talento interno e garante consistência na nossa cultura e nos nossos processos. Nos próximos meses, vamos inaugurar um escritório na Beira e, em novembro, abriremos também uma delegação em Pemba, já a pensar na preparação dos grandes projectos ligados ao sector do gás natural, nomeadamente no âmbito do Liquefied Natural Gas (LNG).

Além da presença territorial, a nossa estrutura é apoiada por uma frota própria de mais de 20 camiões, que garantem o transporte diário no corredor rodoviário entre a África do Sul e Moçambique, assegurando eficiência nas operações cross-border. Temos igualmente experiência consolidada nos principais corredores logísticos moçambicanos, incluindo as rotas de exportação de Maputo, onde só no último ano movimentamos cerca de 400 contentores de açúcar, bem como o corredor da Beira, que liga Moçambique ao Maláui e ao Zimbabué.

PM: Que tipo de clientes/indústrias mais procuram os vossos serviços em Moçambique

TM: O nosso foco passa por servir nichos estratégicos, como o sector alimentar e de bens de grande consumo (FMCG), no qual trabalhamos com quase todos os grandes operadores do mercado, a logística mineira e ainda o fornecimento de bens e equipamentos às operações de oil and gas em Cabo Delgado.

Estes segmentos, aliados à forte componente de soluções aduaneiras e de transporte rodoviário e marítimo, consolidam a Transtrevo como um operador logístico de referência, que alia o conhecimento local a uma rede internacional em crescimento.

PM: Recentemente a Transtrevo assinou uma parceria com a Santos e Vale, com o propósito de expandir operações entre países lusófonos. Poderia explicar os termos dessa parceria, os benefícios esperados para os clientes, e quais operações ou rotas deverão mudar ou ser reforçadas graças a essa aliança?

TM:A Transtrevo tem agora uma parceria estratégica com a Santos e Vale, operador logístico de referência na Península Ibérica, com uma rede extensa de plataformas de distribuição. Esta aliança permite-nos alargar consideravelmente as nossas operações entre países lusófonos, sobretudo entre Angola, Moçambique e Portugal, beneficiando também de sinergias logísticas que a Santos e Vale já domina, tais como recolhas, armazenagem e distribuição eficiente.

O benefício mais imediato para os nossos clientes será o acesso a uma oferta logística integrada mais robusta, com prazos de entrega mais curtos, maior fiabilidade nas cadeias de abastecimento e custos competitivos.

Por exemplo, produtos localizados em centros logísticos da Europa, Bélgica, Holanda ou Itália, poderão ser movimentados com facilidade até Lisboa ou Valência e daí encaminhados para Moçambique, reduzindo atrasos e os custos de transbordo. Isto significa que importações ou exportações que antes enfrentavam múltiplas etapas logísticas agora poderão usar rotas optimizadas sob esta aliança.

Do ponto de vista operacional, essa parceria reforça algumas rotas já existentes e abre outras novas. A rota Europa → Maputo será fortalecida com recolhas mais frequentes em território ibérico, melhor coordenação de transporte marítimo ou aéreo entre Lisboa ou Valência e portos moçambicanos, e logística interna para distribuição nacional mais eficiente. Também devemos ver melhorias nas rotas de correio de carga (cargo transit) e importaçãos FMCG, assim como um apoio logístico mais consistente para operações de mines & oil-gas, conforme as exigências crescentes nas regiões norte de Moçambique e Angola.

PM: Quais são os planos imediatos e de médio prazo da Transtrevo em Moçambique? Pretendem ampliar a capacidade de armazéns, investir na frota adicional, aumentar o número de serviços ou rotas transfronteiriças?

TM: Os nossos planos imediatos em Moçambique passam, antes de mais, por consolidar o crescimento já alcançado e acelerar a capacidade da nossa estrutura actual. Costumamos comparar a Transtrevo a uma viatura em plena autoestrada, já atingimos os 90 quilómetros por hora, mas temos condições para chegar aos 120 sem necessidade de alterar a base organizacional. Isto significa que, com a equipa que possuímos e os processos implementados, ainda temos margem para oferecer soluções logísticas mais rápidas, mais eficazes e mais abrangentes aos nossos clientes.

No plano nacional, vamos avançar com a abertura de delegações na Beira e em Pemba, reforçando a nossa presença estratégica ao longo dos principais corredores logísticos do país. Estes investimentos permitirão apoiar desde os pequenos empreendedores até aos megaprojectos, garantindo que Moçambique dispõe de uma rede logística capaz de responder às necessidades do seu mercado interno e das exportações. Paralelamente, estamos a ampliar gradualmente a nossa frota de camiões.

Bastidores da entrevista

Num país com as dimensões de Moçambique, quem não tiver transporte próprio fica em clara desvantagem, por isso apostamos no crescimento e na renovação da frota como factor crítico para manter a competitividade.

A nível internacional, prosseguimos com o modelo que designamos de plug and play. Neste enquadramento, associamo-nos a parceiros estratégicos em mercados relevantes, integrando-os no ecossistema Transtrevo através de um modelo próximo ao franchise, mas com maior envolvimento na gestão e nos resultados. Estamos já em negociações avançadas com parceiros na Índia e avaliamos outras geografias em função das oportunidades. O objectivo é expandir a marca e garantir soluções integradas que liguem os corredores africanos a hubs internacionais.

Em apenas dois anos, expandimos para África, Europa, América e Médio Oriente, e alcançamos resultados que reflectem a nossa determinação, facturamos 40 milhões de meticais nos primeiros meses de operação, ultrapassamos os 200 milhões no segundo ano e, até agosto de 2025, já atingimos 300 milhões. A nossa projecção é fechar o ano com cerca de 400 milhões de meticais, o que nos coloca entre os principais transitários do país e, já em 2026, entre as maiores empresas nacionais.

Importa sublinhar que não trabalhamos apenas para alcançar números. O crescimento financeiro é consequência natural do foco que colocamos nas relações, com os clientes, com os colegas, com os fundadores e com os parceiros. O nosso propósito não é “dinheiro pelo dinheiro”, mas sim construir uma empresa sólida, orgulhosamente moçambicana, que coloca Moçambique no centro das decisões logísticas internacionais.

PM: Como veem o desenvolvimento logístico no sul de África nos próximos 5 anos, que oportunidades identificam, e que riscos ou obstáculos prevêem?

TM: Quando olhamos para o desenvolvimento logístico no sul de África nos próximos cinco anos, vemos um cenário marcado por grandes oportunidades, mas também por riscos significativos. Do lado das oportunidades, destacamos os investimentos geopolíticos de grande escala que estão a ser feitos em corredores estratégicos.

Um exemplo concreto é o corredor do Lobito, em Angola, que está a receber financiamento norte-americano e que representa uma verdadeira janela de negócio para operadores que queiram consolidar a sua presença na região. Na África Oriental, a Tanzânia e o Quénia têm registado investimentos profundos em infra-estruturas logísticas, reforçando a ligação com os mercados globais.

No caso de Moçambique, os desafios são conhecidos, mas reconhecemos que têm sido tomadas decisões acertadas no que respeita ao desenvolvimento e gestão dos corredores logísticos, em particular os de Maputo e Beira, que funcionam de forma eficaz apesar das limitações. Costumamos dizer que o país tem conseguido “fazer boas omeletes com poucos ovos”. Com uma costa de mais de 3 mil quilómetros, Moçambique tem condições para se afirmar como um operador logístico central na África Austral, servindo tanto os países vizinhos sem saída para o mar como as grandes cadeias internacionais de abastecimento.

No entanto, não podemos ignorar os riscos. A instabilidade geopolítica global, as tarifas impostas por grandes potências, as disputas comerciais e as flutuações de capital podem ter impacto directo nas nossas operações. Existe um provérbio africano que diz, “na luta entre os elefantes, quem sofre é o capim”. Esse é o risco que enfrentamos, sermos afectados por conflitos e decisões tomadas fora do nosso controlo. O desafio está em não permanecermos eternamente como “capim”, mas sim em transformar essa vulnerabilidade em resiliência, através de estratégias de diversificação, parcerias sólidas e uma visão de longo prazo para o sector logístico na região.

PM: Qual é a política de precificação para clientes em Moçambique, como equilibram competitividade com sustentabilidade financeira, especialmente diante de variações cambiais e de custos operacionais elevados?

TM:A nossa política de precificação em Moçambique assenta num princípio claro, equilibrar competitividade com sustentabilidade financeira. Para isso, mantemos uma estrutura administrativa leve e flexível, onde a política de remuneração é baseada essencialmente em performance. Se todos produzimos bem, todos ganhamos, se enfrentamos desafios, todos partilhamos essa responsabilidade. Este modelo dá-nos a agilidade necessária para responder às exigências de um mercado altamente volátil.

Em termos comerciais, procuramos sempre ser competitivos, mas sem cair na lógica de crescer apenas por volume. Não nos interessa assumir operações que, apesar de aparentemente rentáveis no curto prazo, não resolvem um problema real para o cliente ou não garantem uma margem sustentável para o nosso negócio. Todos os dias surgem oportunidades de facturação com grandes volumes, mas preferimos seleccionar projectos com maior componente técnica, que nos permitam oferecer soluções diferenciadas e devidamente remuneradas, garantindo valor tanto para o cliente como para a empresa.

Temos plena consciência de que a volatilidade cambial e os elevados custos operacionais exigem cautela redobrada. Nesse sentido, desenvolvemos mecanismos internos que nos permitem mitigar riscos, como o controlo directo sobre a nossa frota, o conhecimento técnico aduaneiro, uma estrutura in-house especializada e a rede de parceiros internacionais que nos apoia na gestão cambial. Estas ferramentas garantem-nos maior previsibilidade e flexibilidade na definição de preços.

Na prática, conseguimos hoje competir com os maiores operadores, tanto em segmentos altamente especializados, como oil and gas ou contratação de navios, como em sectores de grande impacto no consumo, como a distribuição alimentar e o comércio transfronteiriço com a África do Sul, onde somos particularmente fortes. O nosso compromisso é simples, oferecer preços justos, sustentáveis e tecnicamente adequados, assegurando sempre que a solução proposta responde de forma eficaz às necessidades concretas dos nossos clientes.

Saiba mais aqui: Transtrevo | Global Logistics Solutions

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