“Na massa, o indivíduo adquire, pelo simples facto de fazer parte dela, um sentimento de poder invencível que lhe permite ceder a instintos que, isoladamente, ele teria mantido sob controle. A massa é impulsiva, volúvel, intolerante, e tende a acções que um indivíduo jamais cometeria sozinho.” – Gustave Le Bon (in Psicologia das Massas, 1895). Esta citação reflete exactamente o que vimos acontecer na semana passada (23 a 27 de Dezembro) quase em todo o país, onde as massas foram conduzidas a cometer actos que indivíduos isolados jamais teriam tido a coragem ou a frieza de cometer.
Neste momento, estamos diante da eminência da nova fase das manifestações, previstas para serem anunciadas nesta segunda-feira, 30 de Dezembro. Esta fase, que deverá culminar no dia 15 de janeiro, apresenta um cenário preocupante. À medida que analisamos os acontecimentos recentes, é impossível ignorar os sinais de uma potencial escalada para acções mais violentas e organizadas. Numa das minhas últimas publicações alertei sobre o risco de distribuição de a4mas de fogo a populares. Agora, o risco é o seu uso.
Se me perguntarem qual é a minha previsão, a resposta seria: início de uma nova onda de manifestações a 2 de Janeiro, precedida por acções preparatórias que poderão envolver dois cenários principais:
Cenário 1: O Uso de Armas e Ataques às Instituições do Estado
Com este cenário, prevejo um chamamento popular para bloqueios de vias de acesso e, simultaneamente, acções coordenadas de um grupo mais radical com a missão de atacar instituições centrais do Estado, como a Presidência, o Conselho Constitucional, o Tribunal Supremo e a Assembleia da República.
Há indícios de organização nesse sentido, como o vídeo amador que circulou recentemente mostrando populares de Boane apreendendo um carro com a4mas descaracterizadas. Esta abordagem busca explorar a dificuldade do governo em impor um Estado de Emergência, dadas as limitações legais, podendo levar a consequências devastadoras: uma guerra civil.
Cenário 2: Manipulação de Massas para Pressão Colectiva
Neste cenário, a estratégia giraria em torno da manipulação emocional das massas, com apelos para dias de “paneladas”, hinos e luto nacional – práticas já implementadas com sucesso no passado e às quais as massas não teriam dificuldades de aderir. Isso culminaria numa grande mobilização no dia 14 de janeiro, com marchas direccionadas a instituições como a Presidência e o Conselho Constitucional. As consequências seriam igualmente terríveis, com um provável confronto violento, chacinas e um prolongamento do clima de luto e divisão nacional.
Ainda tem a possibilidade de um terceiro cenário, sobre o qual a minha cabeça de recusa a debruçar-se, que seria a combinação dos dois primeiros cenarios em simultâneo. Este é um cenário que poderia ter aproveitamento de grupos terroristas .
Todos os cenários são alarmantes, não apenas pelos danos imediatos que podem causar, mas também pelas feridas profundas que deixarão em nossa sociedade. Será isto que, enquanto sociedade, queremos para o nosso país?
O Momento de Curar as Feridas
Todo aquele que, como eu, já foi enterrar um ente querido morto no âmbito destas manifestações, coloca-se a seguinte questão: quando chegará o momento de curar as feridas e reaproximar as pessoas que hoje se dividem em alas políticas?
Tenho convicção de que muitos dos que apoiam as manifestações não concordam com a violência, os saques ou a destruição de estabelecimentos públicos e privados. Porém, enquanto sociedade, precisamos traçar um limite claro contra qualquer tipo de agitação à violência ou provocação que levará à violência.
É hora de reflectirmos sobre como queremos que a história lembre este momento: como um período de divisão e destruição ou como um ponto de virada rumo à reconciliação e reconstrução.
Convoco todos, independentemente dos seus pontos de vista, a adoptarem o diálogo como ferramenta principal e a rejeitarem acções que perpetuem a dor e o sofrimento. A paz e a unidade só serão possíveis quando as lideranças – de todos os lados – e a sociedade como um todo priorizarem o respeito, o entendimento e o bem colectivo.
O futuro do nosso país depende das nossas escolhas hoje. Que possamos escolher construir pontes, em vez de cavar abismos.
Por: Vicente Sitoe