O estudo “CFO Survey Moçambique 2024” destaca que a volatilidade dos mercados financeiros, o rápido avanço tecnológico e factores ESG são outras das grandes inquietações para os líderes financeiros.
Neste contexto, o Profile entrevistou Eduardo Caldas, Assurance Partner na Ernst & Young (EY) Moçambique, que descreve os principais resultados do relatório.
Profile Mozambique: Fale-nos dos principais objectivos deste inquérito da Ernst & Young (EY), que é o CFO Survey?
Eduardo Caldas: Este relatório foi realizado numa perspectiva do que já vinha sendo feito pela Ernst & Young (EY) a nível internacional. Trata-se de um relatório direccionado exclusivamente aos serviços financeiros, mais especificamente ao sector da banca e dos seguros, onde se procurou reflectir sobre aquelas que são as preocupações dos CFOs, actuais e futuras, a operar em Moçambique, considerando factores como o talento das pessoas com quem trabalham, que, portanto, compõem a equipa financeira, bem como aspectos relacionados com a aceleração tecnológica e perspectivas de investimento considerando os desafios que enfrentam actualmente.
Um outro objectivo, eu diria, um segundo objectivo, foi fornecer uma visão sobre aquilo que são os desafios actuais e futuros dos CFOs que estão a operar em Moçambique, considerando, obviamente, aquilo que são as actuais condições de mercado e o nível de conhecimento das equipas que compõem as áreas financeiras dos vários bancos e companhias de seguros.
Um terceiro objectivo do estudo foi proporcionar aquilo que são as perspectivas dos CFOs sobre os sectores da banca e dos seguros em Moçambique. Portanto, ter uma visão um pouco alargada, holística, daquilo que são as principais perspectivas dos CFOs relativamente a este mercado.
PM: No relatório em referência quantas empresas ao todo foram inquiridas?
EC: Nós acabámos por inquirir 37 empresas, portanto, 22 bancos e 15 companhias seguros, sendo que dessas 37 entidades recebemos resposta de 24, das quais 14 bancos e 10 companhias seguros.
Tivemos uma amostra bastante representativa, à volta dos 65% do total dos questionários e dos contactos que fizemos, sendo que do total dos contactos para os quais recebemos resposta 12 foram de Administradores (CEO/CFO), 2 de Directores de primeira linha e 10 de Directores Coordenadores.
PM: Por que estes dois sectores: Banca e Seguros?
EC: Acima de tudo porque o sistema financeiro, que incorpora obviamente a banca e os seguros, está actualmente em constante evolução, quer a nível internacional quer, particularmente, em Moçambique, onde há vários desafios e muitas oportunidades no mercado, decorrentes das frequentes mudanças regulatórias que vão ocorrendo ao nível destas duas áreas, estou a falar do Banco e Seguros.
A questão da transformação digital tem sido muito importante, principalmente nestes dois ramos de negócio, na banca e nos seguros, bem como o impacto que as políticas monetárias, por imposição dos vários bancos centrais, têm vindo a afectar o mercado de uma forma geral, especialmente no sector bancário por via do aumento das taxas de juro e do incremento do regime de reservas mínimas obrigatórias, sendo obviamente uma preocupação geral. De referir que embora as politicas monetárias restritivas aumentem as margens financeiras dos Bancos, podem também conduzir ao aumento do NPL dos Bancos. No caso concreto de Moçambique, onde se assistiu a um crescimento do rácio de margem financeira de 64% (2021) para 68,5% (2022), a tendência do NPL, felizmente, foi inversa, passando dos 10,6% (2021) para 9% (2022). De referir ainda, que apesar da tendência global de aumento / manutenção de taxas de juro, recentemente o Banco de Moçambique procedeu a uma redução da sua taxa de referência (“Prime Rate”) de 24,1% para 23,5%, dando um sinal de alguma estabilidade no controlo da inflação e melhorando o Outlook de investimento para os principais investidores.
Eu diria que foi uma escolha, por se tratarem dos sectores de actividade que estão a ter e a sofrer maiores impactos ao nível do quadro macroeconómico e geopolítico actual que existe no mundo inteiro, de muita incerteza, e que têm impactos significativos ao nível dos bancos e das companhias de seguros.
Foi fundamentalmente por isso que nós decidimos escolher estes dois sectores de actividade e obviamente contactar estes CFOs.
PM: Quais são as principais tendências e desafios do sector bancário e de seguros na actual conjuntura?
Claramente, as tendências e desafios que se verificam a nível interno são as mesmas que se verificam a nível global, isto por causa do efeito da globalização e da rápida volatilidade existente nos mercados. Pese embora ambos os sectores de actividade estejam a sofrer grandes alterações, obviamente sector bancário está a andar relativamente mais depressa do que o sector segurador por causa do quadro macroeconómico global que temos neste momento. Assiste-se a uma constante actualização e reforço da regulamentação por parte dos supervisores, tonando-se por vezes muito mais complexa, cobrindo não só matérias relacionadas com as normas contabilísticas e de suporte ao próprio processo de fecho de contas, mas também ao nível de outras áreas, nomeadamente questões relativas aos novos paradigmas da transformação digital, fundamentalmente a digitalização bancária, criação de aceleradores tecnológicos e da agenda ESG com novas politicas sobre sustentabilidade, esta última claramente uma preocupação identificada pelos CFOs das companhias de seguros.
São dois sectores muito dependentes daquilo que é a evolução macroeconómica do país como um todo e, portanto, vão articulando e adequando as necessidades e as várias mudanças que são impostas pelos próprios reguladores.
PM: O que fazer para incrementar os investimentos e as transações? E quais os sectores em que há mais interesse e porquê?
EC: Olhando concretamente para as áreas da Banca e Seguros, que foram os sectores objecto do referido Survey, estamos a falar de um mercado com demasiados “players”, 31 bancos neste momento, dos quais 15 bancos comerciais, 12 micro bancos e 4 cooperativas, e 16 companhias de seguros, das quais 2 do Ramo Vida, 10 a operar no ramo Não Vida e 4 Mistas, para um nível de operações financeiras e de seguro não o suficientemente dimensionadas a estrutura da oferta existente. Talvez por isso se tenha assistido nos últimos tempos a alguns processos de fusão / aquisição no mercado, especialmente no mercado segurador.
Ainda assim, estamos a falar de um mercado que gere globalmente um volume de activos da ordem dos 900 mil milhões de Meticais (2022) e que gerou lucros globais da ordem dos 30 mil milhões de Meticais, isto é, cerca de 3% do PIB de Moçambique considerando valores de 2021.
Não me parece, actualmente, face às actuais condições de mercado e aos recentes desenvolvimentos decorrentes do actual quadro geopolítico, que se perspetivem novos e grandes investimentos ao nível da área financeira.
Existe sim uma tendência crescente de investimento dos actuais “players” no seu negócio, no sentido de se adaptarem às novas exigências regulatórias, à melhoria da qualidade da informação presente nos sistemas de informação, que serve de base ao apoio à tomada de decisão, e aos desafios impostos pela transformação digital, obrigando à implementação de aceleradores tecnológicos.
Leia o relatório: CFO Survey Moçambique – EY